Felipe Vignoli e Vitória Kramer
A transição para a economia de baixo carbono e a transição justa¹ se tornaram uma questão de competitividade econômica e de protecionismo das cadeias produtivas nacionais. A União Europeia (UE), por exemplo, pretende movimentar até $80 bilhões de dólares por ano com mecanismos de taxação de carbono entre fronteiras (EU Carbon Border Adjustment Mechanism – CBAM²). Os Estados Unidos da América (EUA) planejam investir até $2 trilhões de dólares nos próximos dez anos, por meio de investimentos e taxações para incentivar, por exemplo, o uso de energia limpa e a infraestrutura para tecnologias verdes (The Inflation Reduction Act – IRA³). Já a China possui planos arrojados para alcançar a neutralidade em carbono até 2060, que demandam pelo menos $1 trilhão de dólares até 2030.
O Brasil, por sua vez, apresenta vantagens comparativas significativas para atrair o apetite de investimentos sustentáveis. Temos o potencial de destravar soluções climáticas naturais e compensar as emissões de gases de efeito estufa (GEEs) a nível global, ao mesmo tempo em que aceleramos o desenvolvimento econômico do país, cobrindo lacunas históricas em infraestrutura, saneamento, energia, transporte, bioeconomia e green commodities.
Com os recursos sendo alocados estrategicamente, o Brasil tem a oportunidade de propor um novo modelo de produção e competitividade baseado no seu potencial de ativos verdes e de transformar-se em um país com emissões líquidas zero. Há potencial para que o país se converta em provedor de mais de 35% dos créditos de carbono a nível mundial, tornando-se também um grande vetor de apoio à transição para uma economia global de baixo carbono⁴. Devido à sua matriz energética majoritariamente composta por fontes renováveis, o Brasil pode consolidar-se como um grande exportador de produtos com baixa pegada de carbono e/ou da bioeconomia⁵.
Como medidas de reação à competitividade internacional, somadas ao baixo volume de capital alocado na captura de valor de nossas riquezas naturais e redução de nossas lacunas sociais, diversas iniciativas governamentais no âmbito federal, estadual e subnacional emergiram. Como exemplo, o Tesouro Nacional anunciou sua intenção para emissão de títulos verdes ainda em 2023⁶. Por outro lado, o Governo Federal anunciou recentemente R$5 bilhões para a descarbonização da energia elétrica na Amazônia. Adicionalmente, novos planos estão sendo traçados para os R$3,4 bilhões do Fundo Amazônia, com maior participação dos municípios. O próprio BNDES, gestor do Fundo Amazônia, vem se mostrando um ator relevante no financiamento de soluções climáticas⁷. No âmbito estadual, o Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo (BANDES), por meio do Fundo Soberano do Estado do Espírito Santo (Funses), lançou o Programa Funses ESG de Desenvolvimento, que atende projetos de investimento entre R$20 milhões e R$50 milhões por empresa.
Em meio à necessidade de maiores investimentos públicos, dentro de um cenário de restrição fiscal e baixo espaço para barreiras protecionistas, soluções que alavanquem o potencial do capital público, via investimento privado, destacam-se como uma importante saída. Nesse sentido, é preciso abrir espaço para iniciativas que destravem o potencial do Brasil em tornar-se líder na transição para uma economia de baixo carbono. Por meio da concertação estratégica entre os setores público e privado, o Brasil poderá aproveitar suas evidentes vantagens ligadas ao capital natural e fomentar o mercado de financiamento sustentável em favor do bem estar social, ambiental e econômico.
[1] Mecanismos de transição justa tratam dos efeitos sociais e econômicos da transição energética de baixo carbono, objetivando a permanência de empregos e a manutenção do bem estar social. Para mais informações, veja o site da Comissão Europeia sobre o assunto.
[2] EU Carbon Border Adjustment Mechanism (CBAM)
[3] Para mais informações, veja a publicação da Mckinsey sobre o IRA.
[4] Segundo estudo da Waycarbon, a participação brasileira na oferta de créditos mundiais em mercados voluntários foi de 12% em 2022. Esse potencial poderia chegar até 48,7% da demanda global no mercado voluntário e 28% nos mercados regulados.
[5] Artur Ramos et al., Brazil Climate Report 2022: Seizing Brazil’s Climate Potential, 16 de setembro, 2022.
[6] Na América Latina, apenas Colômbia, Chile e México possuem títulos soberanos temáticos.
[7] Entre suas ações, o BNDES deverá fazer aporte no Fundo do GEF e pretende fazer captação de até R$ 1 bilhão para soluções climáticas. Por outro lado, o BNDES vem apostando no impulso do Blended Finance para alavancar o capital privado com soluções de interesse público. Nos últimos anos, para o BNDES, a agenda verde foi vista como um pilar de posicionamento do banco.